POLÍTICA E JUSTIÇA: SÃO SEBASTIÃO FERVE


Em São Sebastião/SP, governistas e oposicionistas travam um duelo instigante. Não, não falo de disputa política por meio de convencimento popular em busca de votos, a próxima eleição é só no ano que vem, em 2014; minha abordagem é outra, a dos desdobramentos administrativos e judiciais envolvendo dois dos principais atores políticos do momento na cidade, um é prefeito e o outro é ex-prefeito. Mas, o que, em primeira leitura, parece se restringir a disputa entre ambos, com as muitas variáveis possíveis de seus desdobramentos, termina deixando em estado de alerta um terceiro ator desse processo. 

Meu arrazoado:


O ex-prefeito da cidade, Juan Garcia, era servidor público de carreira na função de médico. Há alguns anos foi exonerado. Após conquistar a única eleição majoritária de sua vida, por medidas administrativas sob a sua determinação e por autorização judicial, foi reinserido no quadro de servidores do município e ainda gozou de benefícios trabalhistas concedidos em seu próprio governo. Em período mais recente, após ter cometido diversas infrações disciplinares, com base no Estatuto do Servidor, foram instaurados dois processos administrativos disciplinares da Prefeitura, que culminou com a nomeação, por ofício de Portarias, de duas Comissões Processantes. Como resultado dos procedimentos administrativos adotados, creio eu que sob a luz da legislação pertinente, terminou sendo demitido "a bem do serviço público"

Juan Garcia, em sua defesa, impetrou judicialmente dois mandados de segurança, tendo sido distribuídos um para cada Vara Civil da cidade, alegando, em síntese, que nos processos administrativos disciplinares teve violado seu direito líquido e certo ao devido processo legal, com as garantias da ampla defesa e do contraditório, pleiteando, liminarmente, a nulidade desses processos administrativos. Em ambos teve seu pedido de medida cautelar negado pelos Juízes Guilherme Kirschner (2° Vara), e Mirian Keiko Sanches (1° Vara), este último foi deliberado na sexta-feira (20). Juan aguarda, portanto, o julgamento do mérito, não sendo mais servidor público municipal.

Pelas regras do jogo, ele tem direito também a um "Pedido de Reconsideração", numa última tentativa de reverter na Prefeitura essa decisão que lhe foi desfavorável. Provavelmente já ingressou com essa medida, não dá para afirmar, afinal, esse tipo de processo não é aberto à opinião pública, correndo em sigilo para preservar a imagem do servidor. Mas, considerando que ele tenha exercido esse direito, a julgar por casos semelhantes, há prazos legais para uma decisão do Prefeito em relação ao seu pedido; conquanto, tomando por base haver uma decisão proferida pela Comissão Processante do Município e o indeferimento de seus pedidos às duas Varas Cíveis da cidade, imagino que não logrará êxito. 

Se eu estiver correto, surgirá um outro problema para Juan Garcia, qual seja, as devidas notificações, que em casos como este devem ocorrer, da Prefeitura à Justiça, o que, em meu entendimento, até que ele consiga reverter - caso consiga, essa decisão o tornará automaticamente inelegível. Contra si, Juan tem ainda a decisão da Justiça Eleitoral de 1° instância que reprovou as suas Contas Eleitorais, ao que certamente ele recorre. Não faltam elementos para tornar o debate político ainda mais aguçado, com um quê de conhecimento e toda sorte de interpretações jurídicas. Do TCE, para se ter uma ideia, não para de chegar apartados sobre suas Contas de gestão, para conhecimento e providências da Câmara de Vereadores. 


O Prefeito, Ernane Primazzi, foi o primeiro reeleito da história da cidade, tendo vencido nas urnas o ex-prefeito Juan Garcia por duas vezes consecutivas. Mas, o resultado das urnas foi judicializado pelo ex-prefeito Juan. Em 1° instância houve de tudo. Nos dos processos em que o Juiz Guilherme Kirschner decidiu pela cassação, o TRE/SP teve outro entendimento e reformou as decisões; aliás, todas as decisões do Juiz Eleitoral da cidade foram reformadas pelo TRE/SP. Nos autos do processo n° 191.2012, todavia, em que o TRE dividiu-se, deixando nas mãos do Presidente do colegiado a decisão sobre a substituição do candidato a vice-prefeito na chapa vencedora, tendo saído o Wagner Teixeira e entrado o Dr. Aldo,  a decisão foi pela cassação do diploma do Prefeito. Um novo debate político com um quê jurídico foi iniciada. 

Segundo os advogados de Ernane, "o prefeito se mantém no cargo já que essa decisão tem Efeito Suspensivo, sobre a qual cabem recursos dentro do próprio TRE/SP" - e todos eles deverão ser esgotados pelo que entendi, pois há profundas discordâncias em relação a essa decisão, "como cabe também recurso ao TSE - que já tem pacificado entendimento sobre esse tipo de processo, criando jurisprudência", alegam. Um exemplo usado para ilustrar, pode ser o caso de Paulínea, em que o candidato a prefeito foi mudado 24 horas antes do pleito, venceu as eleições, o juiz eleitoral não diplomou, o TRE manteve a 'cassação', e o TSE reverteu, justamente por entender que a substituição pode ser feita a qualquer tempo, sem configurar fraude.

Cabe esta leitura
Síntese de uma Decisão do TSE

"[...] Registro de candidatura. Candidato substituto. Cargo. Prefeito. Alegação. Inconstitucionalidade por omissão. Art. 13, da lei 9.504/1997. Incompetência. Justiça eleitoral. Possibilidade. Substituição. Qualquer tempo antes do pleito. [...] Procedimento. Escolha. Candidato [...] I - A arguição de inconstitucionalidade por omissão somente é cabível no âmbito do controle concentrado, por meio da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. II - A jurisprudência do TSE admite a substituição de candidato a qualquer tempo antes da realização do pleito. [...] IV - Possíveis irregularidades na escolha da candidata substituta pela coligação é matéria interna corporis e somente pode ser alegada pelos partidos integrantes desta. [...]


(Ac. de 22.10.2009 no AgR-REspe nº 35.843, 

Rel. Min. Ricardo Lewandowski.)


O ex-prefeito Juan Garcia acusa fraude nas eleições que perdeu pela segunda vez consecutiva para o mesmo adversário - e tenta no tapetão inverter a decisão do povo outorgada nas urnas e, para isso, lança mão de todos os artifícios legais que a legislação lhe confere e sua expertise cria. O Prefeito da cidade, Ernane Primazzi, segue se defendendo e contestando todas as teses levantadas pelo seu algoz político. Ao mesmo instante, por medidas administrativas, Juan vai sendo penalizado e concorre à inelegibilidade, como já disse.


Nessa toada, os debates sociais e populares ganham as ruas e a rede, quando até mesmo correligionários, eleitores e simpatizantes do terceiro colocado nas eleições, o tucano Felipe Augusto, já se assanham crendo na possibilidade da cassação de um e na impossibilidade da diplomação e posse do outro. Mas, por mais ávidos ou esperançosos que estejam, isso não sai do campo das expectativas pessoais e especulações partidárias, sempre com um quê jurídico à mesa. O próprio Felipe Augusto não sai da toca, se permitindo a um obsequioso silêncio e, caso decida opinar sobre o caso, já que foi um ator importante na disputa deste pleito judicializado, pode ter contra si pesados questionamentos em relação aos projetos do Governo do Estado - que é de seu partido, como por exemplo o caso da nova rodovia, sobre o qual tem se mantido distante e indiferente. É um risco político que ele e sua entourage devem estar calculando.

Pessoalmente, entendo que ainda ainda não é possível de tudo isso ser mensurado, avaliado se causou mais estragos e desconfianças ou mais aproximação e interesse social pela política, na cidade. Uma coisa é certa: nada será mais do mesmo jeito, todas essas ações e consequências produzem seus efeitos sobre o tecido social e conteúdo político da cidade, resta saber se para melhor ou pior. Com a palavra, os especialistas.
É o jogo!
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14h47min.      -     adelsonpimenta@ig.com.br

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