VIA REPRESENTATIVA, NÃO PARTICIPATIVA

Em São Sebastião, Prefeito e Vereadores aprovam Plano Diretor sem audiências públicas. 


Hoje, 09/12, é do Dia Internacional Contra a Corrupção, penso que seja um momento oportuno para falarmos acerca do que tem ocorrido, especialmente dos últimos acontecimentos em São Sebastião.
Não falo sobre os vários Inquéritos policiais - com investigações avançadas em curso. Não por hora. O papo aqui é outro nesse momento.
Não sei o que foi usado para convencer o Prefeito e os vereadores a aprovarem o Plano Diretor do Município sem a realização de nenhuma audiência pública - e ainda em regime de urgência. Eles devem ter as sua razões. Sempre tem.
Mas, vamos analisar o que de fato nos interessa: O que é e como se faz um Plano Diretor?
É matéria constitucional, afinal, está definido na Constituição Federal de 1988. Sua organização e regulamentação, digamos assim, foi aplicada na forma da Lei Federal 10.257, de 10 de julho de 2001, que ficou denominado oficialmente como Estatuto da Cidade. Essa é a "Constituição" que norteia juridicamente a "Política Urbana".
As pessoas têm direito à cidade.
Quando os vereadores de São Sebastião acataram a "proposta" de um "Plano Diretor" e aprovaram em "Regime de Urgência" sabendo do histórico dessa discussão, ignorando o fato de não ter havido a realização de novas audiências públicas e, ainda, como Casa revisora e fiscalizadora, abriram mão de seu papel nesse sentido, forçaram uma democracia representativa e não participativa.
O próprio Ministério das Cidades publicou um guia basilar para elaboração dos planos diretores que estabelece uma série de etapas para sua elaboração, priorizando a participação social em todo o caminho.
PROCESSO IGNORADO
Ele começa com o estabelecimento de um Núcleo Gestor com participação de lideranças dos diferentes segmentos da sociedade (governo, empresas, sindicatos, movimentos sociais), segue com a realização de uma leitura (tanto da perspectiva técnica quanto da perspectiva comunitária) da cidade como é hoje, passa à elaboração e discussão de uma minuta de lei e, finalmente, a aprovação na Câmara Municipal.
Essa abordagem vem ao encontro da diretriz do próprio Estatuto da Cidade, que pressupõe a gestão democrática, com participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.
AUDIÊNCIA PÚBLICA
O instituto da audiência pública não faz parte do processo legislativo constitucionalmente previsto. A Constituição prevê o processo legislativo nos artigos 61 a 69. Entretanto, o legislador constituinte fez questão de mencionar a importância da participação da população em algumas decisões, como é o caso da previsão de audiência pública pelas comissões do Congresso Nacional, conforme o artigo 58, § 2.º: Art. 58.
O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação. [...] § 2º - às comissões, em razão da matéria de sua competência, cabe: [...] II - realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil; Considerando o princípio constitucional da simetria, as regras emanadas a Constituição no processo legislativo federal se aplicam também nas casas legislativas estaduais e municipais.
MOREIRA NETO (1992, p.88) define audiência pública como “um instituto de participação administrativa aberta a indivíduos e a grupos sociais determinados, visando à legitimação administrativa, formalmente disciplinada em lei, pela qual se exerce o direito de expor tendências, preferências e opções que possam conduzir o Poder Público a uma decisão de maior aceitação conceitual”.
Ainda, a audiência pública no Brasil objetiva embasar o desempenho da função judiciária (art. 9º, §1º, da Lei nº 9.868/1999) e da missão institucional do Ministério Público (art. 27, parágrafo único, IV, da Lei nº 8.625/1993).
O ESTATUTO DA CIDADE
A Lei n.º10.257/2001 regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição da República e, entre outras providências, estabelece as diretrizes gerais da política urbana. Sobre as audiências públicas, estas encontram-se previstas em três momentos distintos no Estatuto da Cidade.
O primeiro:
Está previsto no artigo 2.º, XIII, como uma das “diretrizes gerais” da política urbana:
Audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população. A participação democrática no processo decisório tem por objetivo principal garantir e satisfazer o direito que todo cidadão tem à cidade. Em outras palavras: tem relação direta com o princípio da dignidade da pessoa humana.
É nesse contexto que se inserem as audiências públicas.
O segundo:
Consta do art. 40, §4º, I, dessa Lei nº 10.257/20013.
Segundo este dispositivo, para elaborar o plano diretor e fiscalizar a sua 3 Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. implantação, os municípios devem realizar “audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade”.
O plano diretor é obrigatório para municípios que possuam mais de vinte mil habitantes (artigo 41, I, da Lei n.º 10.257/2001).
O terceiro:
O de previsão das audiências públicas no Estatuto da Cidade está descrito no artigo 43, II.5
Prevê-se a realização de audiência pública como condição obrigatória para aprovação pela Câmara Municipal, como meio de participação direta de particulares na gestão orçamentária, como por exemplo na elaboração do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual. Dos dispositivos mencionados denota-se a intenção do legislador de tornar democrática a gestão da cidade.
Devido ao alto número de problemas de gestões § 1o O plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas. § 2o O plano diretor deverá englobar o território do Município como um todo.
Revisão Decenal: § 3o A lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos.
Audiências Públicas: § 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:
I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;
II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;
III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.
Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados, entre outros, os seguintes instrumentos: debates, audiências e consultas públicas; municipais, à burocracia e ao afastamento dos verdadeiros problemas da sociedade, o Estatuto da Cidade apresentou-se como um modo de combater os reais vícios relacionados às necessidades dos cidadãos.
É isso!
Não discuto sequer sobre a "verticalização", isso é mérito da matéria, e o momento de discutir isso é na audiência pública. O que abordo é o rito, os procedimentos adotados pelos poderes Executivo e Legislativo. Sem cumprir as regras previstas em lei, todo o restante da discussão está contaminado. A sociedade civil organizada precisa ir às barras da Justiça e provocar a suspensão imediata dos efeitos dessa votação.
É o meu entendimento.




Fontes de consulta / pesquisa:
Politize (incluindo a imagem ilustrativa);
Estatuto das Cidades;
Ministério das Cidades;
Senado Federal;
JusBrasil;
Trabalho acadêmico da Elaine Gonçalves e Mariana Barbosa, no XI Seminário Internacional de Demandas Sociais e Políticas Públicas na Sociedade Contemporânea

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