Guerra de versões sobre oxigênio do hospital asfixia a verdade em São Sebastião


 
Não é novidade que os médicos de um Hospital conversem entre si; pelo contrário, é importante. Qualquer empresa, roda de amigos, laços de família, enfim, tem um grupo para dialogar. Eles se falam desde antes da cidade ser considerada uma das melhores em números de deslocamentos por causa dos esforços de sua população, e quando extravasam subscrevem até uma Carta de descontentamento ao Prefeito. 

O que chama a atenção, todavia, em São Sebastião, é que mais uma vez conversas em grupos da rede social Whatsapp coloquem o Governo local nos autos judiciais. Insegurança social é elemento de desestabilização.

O caso anterior se deu em relação a campanha eleitoral vitoriosa desse grupo político.  Originado numa perícia da Polícia Federal, as conversas se tornaram objeto de uma Ação de autoria do MP Eleitoral - com pedido de cassação do mandato do Prefeito Felipe Augusto. 

O segundo e atual caso é sobre os trechos do que andou confabulando os médicos do Hospital de Clínicas de São Sebastião, que faz parte de um Inquérito conduzido pelo MP e Defensoria Pública - em que apura denúncias de possíveis mortes no HCSS por estrangulamento e falta de oxigênio.  
 
 
Arte UOL


A repercussão é internacional.

A leitura feita nos autos pelas autoridades que conduzem o Inquérito asfixia outras impressões ou análises mais aprofundadas que precisam obrigatória e necessariamente serem feitas. É quase um julgamento vaticinando uma conclusão, senão, repitamos: "... revelam uma tragédia consumada e uma provável tragédia anunciada". É fatalista.

Se o recorte for unicamente o conceito da perda de alguém por um óbito, então sim, isso é uma 'tragédia". A morte é uma perda irreparável. Mas, observemos as palavras usadas nos autos, porque parece que é outra coisa que estão querendo dizer. 

Segundo o defensor público Filovalter Moreira, "se o número de pacientes aumentar, as usinas de oxigênio podem não suportar". O único cuidado está no palavra "podem", essa é a brecha para o autor não ser acusado de pressa sobre a investigação, o que, convenhamos, seria tão danoso quanto a confirmação da procedência do que se investiga. É cedo para isso, afinal, vida humana não é analisada por uma combinação matemática, química, enfim.

Especialistas com os quais tenho conversado, por exemplo, são categóricos em afirmar que nem mesmo uma situação extrema de falta de oxigênio, de respirador mecânico, pode ser a causa direta de um óbito. Cada caso tem sua própria natureza. Havendo pouco ou muito, as condições de atendimento melhoram, mas, é o histórico de saúde do paciente que diz mais que a situação em que fica submetido no Hospital. É complexo.

Não sei qual o grau do conhecimento técnico desses servidores públicos, quais sejam, Promotores de Justiça e Defensores Públicos, sobre o uso de oxigênio para fins medicinais, e quero crer que a perícia técnica já tenha produzido algum Relatório; que a exumação dos corpos, se já houve, tenha produzido um Laudo conclusivo sobre a causa mortis, e que, obviamente, todas as partes interessadas e envolvidas direta e indiretamente já tenham sido ouvidas, e até confrontadas.

Sem que todas as fases de um intrincado caso deste sejam providenciadas, o alarmismo pode desoxigenar a verdade factual, tornar insepulto o objeto do Inquérito. 

As famílias sofrem com isso, a sociedade paga um alto preço - porque tem custos. Me preocupa que isso possa estar sendo politizado em alguma dose, quem sabe beirando a um certo ativismo judicial, coisas assim não são de boa prescrição médica nem tampouco de grande valor ao Direito.

Na Justiça esse tipo de revelação pode ressuscitar. 

Penso que o medo social - semeado com mensagens equivocadas, quer seja nos autos e divulgados pela imprensa, quer seja por possíveis vazamentos seletivos; quer seja por conversas feitas fora dos autos por denunciantes e/ou denunciados, nada disso é remédio. 
 

A cidade tem 20 leitos de UTI para covid-19, conforme publicou o portal UOL. Na quarta-feira (24), seis deles estavam ocupados. Desde o começo da pandemia, 74 pessoas morreram da doença em São Sebastião.
 
A Prefeitura disse, em nota, que:
"conta com usinas de oxigênio próprias e que até o momento não houve qualquer tipo de interrupção do sistema". Afirmou ainda que vê com "estranheza" as mensagens, já que não foi registrada "oficialmente qualquer irregularidade à direção do hospital".

Dito isto e dessa forma, fica claro que só a investigação feita com cuidado e rigoroso critério técnico será capaz de estabelecer a verdade. O próprio Prefeito já devia ter determinado, se é que isso não ocorreu ainda, a abertura de uma Sindicância Interna. Todo conteúdo gerado por essa questão, tamanha a sua complexidade e importância, deve ser embasado tecnicamente, feito às claras.

A guerra de versões via redes sociais e imprensa, a azáfama, só atrapalha, não contribui para outra coisa senão para colocar a população em polvorosa. E, com isso, os riscos aumentam.

Aguardemos, protegidos com máscara sanitária e verificações de notícias, os desdobramentos, a conclusão e os encaminhamentos das autoridades que conduzem o Inquérito. 

Até que isso ocorra, o que resta são filigranas de retórica que não salvam vidas, antes, porém, mumificam compreensões. É seríssimo demais o que está sendo inspecionado. Não são as conversas de redes sociais que desumidificam ou odorizam o Inquérito. 

Só a verdade dos fatos interessa, ainda que essa esteja na UTI, e é isso que quero crer que esteja sendo implacavelmente perseguido pelos socorristas da investigação. 

É vital à sociedade que estejam cheios de ar os pulmões dos órgãos públicos, mantendo viva e sem respirar por aparelhos as expectativas do usuário do Sistema como um todo, sua confiança nos profissionais que lhes atendem, seja no MP, na Defensoria, no Governo, e, claro, na estrutura oxigenada do Hospital que conta com uma equipe médica respeitável, de reconhecida capacidade.

O contribuinte, chamado de paciente na Saúde e na Justiça é quem custeia toda essa engenhosa máquina pública que lhe deve satisfação, e isso não se alcança com a pressa de palavras ofegantes, mas, com a calma de exames cirurgicamente bem feitos, juridicamente inapeláveis. 
 
 


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