ESTADOS E MUNICÍPIOS DISPUTAM A EXTRAÇÃO DOS ROYALTIES DO PETRÓLEO

 Artigo

Tema relacionado às finanças públicas no país – sob interesse direto da nossa região do Litoral Norte de SP, não está solucionada desde 2012


Principalmente as cidades de São Sebastião e Ilhabela, na região do Litoral Norte de SP, já beneficiadas, tem interesse direto na discussão em torno da possível redistribuição dos royalties do petróleo, que foi aprovada através da lei 12.734/12, e que está sub judice, ou seja, com seus efeitos suspensos por uma medida cautelar do Supremo Tribunal Federal – STF, referente as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4.916, 4.917, 4.918 e 4.920.

Entenda: Se julgada inconstitucional, é o que advoga o Estado do Rio de Janeiro que sofreria o maior impacto se a lei já estivesse em vigor, afinal é o maior estado "produtor" e 'confrontante' do país, os riscos de uma quebradeira em suas contas serão menores. A receita é tão importante sobre a composição orçamentária, que já teve inclusive parcelas adiantadas.

O Caso: Em 2019 foi marcado o primeiro julgamento da liminar concedida pela Ministra Cármen Lúcia, que impede a nova distribuição dos Royalties, e, desde então, vem sendo pautada e retirada de pauta, sob pressão. Especialmente os Estados do Sudeste, sendo o Rio de Janeiro, Espírito Santo e até São Paulo friccionam para que se mantenha sob liminar, enquanto novos estudos técnicos são elaborados; e, no lado oposto estão entidades com interesse em derrubar a liminar, como é o caso da Frente Nacional dos Prefeitos – FNP e Confederação Nacional dos Municípios - CNM, que, juntas, reivindicam uma Decisão pela constitucionalidade.

É a maior batalha por receita já travada no País, que independe do debate nacional sobre um novo Pacto Federativo, Reforma Tributária, entre outras agendas.

Produtores e Confrontantes

Estados e Municípios definidos como produtores - são aqueles em cujo território ocorre a produção, portanto, onde se encontram os campos terrestres.

Os Estados e Municípios aonde o petróleo e gás natural são produzidos na plataforma continental (no mar) são considerados “confrontantes”.

Muito se fala sobre o impacto fiscal das mudanças para os Estados e Municípios “produtores”. A discussão é válida. Porém, vejam, para os Estados e Municípios efetivamente produtores não há significativa alteração na Lei de 2012 - sobre os percentuais de royalties à serem recebidos e, portanto, não sofrerão impacto fiscal com a redistribuição.

O que está no centro da discussão é justamente os recursos gerados pela produção offshore, de Estados e Municípios confrontantes, os que dependem do mar. Este é, por exemplo, o caso das cidades de São Sebastião/SP e Ilhabela/SP, que, com a descoberta do pré-sal, têm gerado altos volumes de produção e, consequentemente, de receitas de royalties e participação especial - e que tendem ainda a se ampliar nos próximos períodos.

O Pulo do gato 1: Em virtude dos recordes de produção “neste momento” (friso), os interessados querem aproveitar este ensejo para forçar a nova divisão. Alegam que, com a produção elevada e, consequentemente, uma grande geração de receita de royalties, os impactos fiscais para os atuais beneficiados seriam, teoricamente, equiparados e, portanto, os Estados não sofreriam tanto com a queda de arrecadação.

Ainda não se tem um estudo técnico elaborado e direcionado para as perdas dos Municípios, somente os Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo elaboraram seus estudos. Porém, ao analisamos as arrecadações dos municípios de São Sebastião e Ilhabela vimos que ambos os municípios tiveram perdas em virtude da queda na produção nos anos de 2019 e 2020.

São Sebastião fechou a arrecadação de Royalties em 2019 com aproximadamente R$ 118 milhões, enquanto Ilhabela, no mesmo exercício, teve R$ 715 milhões arrecadados. No ano posterior, em 2020, São Sebastião fechou com o montante de aproximadamente R$ 94 milhões e Ilhabela no mesmo período fechou com R$ 502 milhões.

Sendo assim, no período de 2019 e 2020, tivemos cerca de R$ 24 milhões de redução na receita do Município de São Sebastião e R$ 213 milhões na cidade de Ilhabela, totalizando cerca de R$ 237 milhões de perda na arrecadação com essa fonte, na região do litoral norte paulista, nesse período.

São Sebastião X Ilhabela

Ilhabela, que criou um Fundo Soberano para poupar recursos dos royalties do petróleo, ainda teve, além das perdas com relação a queda na produção, um importante revés. Na esfera administrativa, num procedimento iniciado junto ao IBGE, houve uma discussão técnica com São Sebastião.

Um reestudo com reconhecimento de divisas geográficas foi reclamado pelo Prefeito sebastianense, Felipe Augusto, que buscava o direito ao recebimento de metade dos royalties do petróleo que Ilhabela recebia. A ANP (agencia responsável pelo repasse da receita aos municípios), foi acionada pelo IBGE e redefiniu o rateio, beneficiando o pleito sebastianense.

O Prefeito de Ilhabela, Antonio Colucci, determinou ao setor jurídico a abertura de uma Ação na Justiça, e o Município obteve uma medida liminar suspendendo a divisão desses valores com São Sebastião. Os recursos, ou seja, metade do que era previsto ser recebido por Ilhabela, estão sendo retidos em uma conta judicial, até que seja julgado o mérito.

O pulo do gato 2: No contexto atual, a maior produção passou da região da Bacia de Campos - onde atingia municípios do Estado do Rio de Janeiro, para a Bacia de Santos, onde se encontram os Municípios de Ilhabela e São Sebastião.

Ilhabela é o município que se tornou beneficiário na Região recentemente e seria uma boa brecha para aplicação de tais mudanças no rateio dos royalties antes que os novos municípios beneficiários se tornassem também dependentes dos recursos. Inclusive porque o impacto da nova regra é maior para os municípios confrontantes, mais do que para os estados. Ou seja a justificativa para a conclusão rápida da discussão seria a dependência dos Municípios que recentemente foram beneficiados, como é o caso de Ilhabela.

Estudos e projeções: No texto para discussão técnica nº 2.566 do IPEA, de junho de 2020, Gobetti, Orair, Serra e Silveira elaboraram uma projeção de receitas estaduais de royalties e participação especial de 2020 a 2023 considerando dois cenários: com e sem regra de transição.

Os autores apontaram que, mesmo sem uma regra de transição, os três únicos estados que “perdem” com mudança na lei (RJ, SP e ES) teriam arrecadações maiores ou próximas da média de receitas recebidas entre 2009 e 2018. Com a regra de transição aplicada, este cenário seria ainda mais confortável para os estados confrontantes.”

Já para os municípios de nossa região, destaco São Sebastião e Ilhabela, ainda não se tem ao certo, nem foi publicado ou contratado estudo para embasar reestruturações nos serviços públicos, fiscais, arrecadatórios destes municípios, Ouso dizer que essas Prefeituras estão em atraso nesse sentido, já deveriam ter contratado estudos dessa natureza - de projeção de cenários no mercado do petróleo, conjuntura econômica e previsões de arrecadação.

Pulo do gato 3: (aplicação dos recursos)

Alguns debates ainda são embasados no argumento de serem, os royalties, compensações financeiras devidas pelos impactos socioambientais causados pela indústria do petróleo nos estados. Mas, contraditoriamente ao argumento, os estados e municípios beneficiários utilizam os recursos, majoritariamente, em gastos correntes, desconsiderando as possibilidades de investimento com a finalidade que alegam.

O Rio de Janeiro, por exemplo, gasta pelo menos 85% do recurso com pagamento de aposentadorias e pensões, que, apesar de extrema importância, não influi diretamente na contenção deste impacto. Ao tratar os royalties do petróleo como receita corrente ordinária, os municípios expõem seus orçamentos públicos à fragilidade - ao se tornarem dependentes destes recursos.

O Município de São Sebastião destina quase na totalidade seus recursos de Royalties do Petróleo para custear despesas correntes das mais variadas. O de Ilhabela se difere um pouco, aplica em Fundos: de Saneamento, e no Soberano, e pensa no significado original de mitigar efeitos da indústria do petróleo.

Porém, em meu entendimento, por ser um município recém beneficiado com esta receita, chegará em breve o momento em que será majoritariamente dependente desta, se não fizer os estudos necessários. Há riscos inclusive de ter até a sua folha de pagamento comprometida em muito pouco tempo.

Pulo do gato 4: Outro argumento colocado no debate é que tais participações governamentais funcionariam como uma compensação aos estados “produtores” diante do regime diferenciado do ICMS - incidente sobre o petróleo e seus derivados, que, ao contrário do que ocorre com outras mercadorias, é tributado no destino e não na origem.

Deste ponto de vista, talvez fosse necessário a elaboração de um diagnóstico da distribuição das receitas de ICMS, com vistas a pensar um novo arranjo tributário para o setor, inclusive considerando a possibilidade, mesmo que de longo prazo, de esgotamento e/ou redução da produção de petróleo e gás no país". É imprescindível.

O país está em crise, o momento é tenso e o corte imediato de parte da receita dos royalties para esses entes subnacionais, principalmente, traria ainda mais gargalos fiscais e problemas estruturais para a nossa região, sem que haja um período de transição com um cronograma escalonado de redução dos repasses. É inviável cortar sem um período de adaptação.

Seria importante um debate mais aberto entre as cidades do Litoral Norte, para tentar soluções locais com o advento da distribuição dos royalties entre os entes da Federação. E, inclusive, seria fundamental que fosse adicionada ao debate, a reflexão sobre os usos que se faz deste recurso.

A cidade de Ilhabela - como pioneira - criou o primeiro Seminário Nacional dos Royalties, tendo a participação de 17 municípios e 7 Estados representados, com o tema Aplicação Responsável dos Royalties, criando na ocasião o Primeiro Fundo Soberano de Royalties do Pais, na qual tive a honra de realizar, coordenar e implementar todo o projeto, que hoje está sendo modificado e aperfeiçoado, não desmerecendo os idealizadores.

Tiago Corrêa, administrador e gestor na esfera pública e setor privado

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